Rio Dois Rios – Lula continua na fila da Lava Jato

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Desde a prisão do pecuarista João Carlos Bumlai, em novembro passado, está disseminado pelo governo e pelo PT o temor de que se acumulem provas que possam comprometer o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Operação Lava Jato. A revelação do depoimento do ex-diretor de internacional da Petrobras Nestor Cerveró (foto) aproxima Lula das denúncias de modo inequívoco e dará ainda mais trabalho a seus advogados.

Cerveró afirmou ter recebido de Lula, após deixar a área internacional de Petrobras, um cargo na BR Distribuidora como “reconhecimento” por seu papel na quitação de um empréstimo de R$ 12 milhões concedido a Bumlai pelo Banco Schahin e encaminhado ao PT em 2004. A quitação, de acordo com a delação premiada de Cerveró, com depoimentos do próprio Bumlai e de executivos do Grupo Schahin presos na Lava Jato, foi feita por meio da concessão de um contrato de R$ 1,6 bilhão ao grupo, assinado em 2009, para a construção de uma sonda da Petrobras.

Procuradores da Lava Jato suspeitam que metade do dinheiro do empréstimo foi usada para o PT pagar uma chantagem do empresário Ronan Maria Pinto, de Santo André, que “ameaçava envolver pessoas relacionadas à cúpula do Partido dos Trabalhadores no Caso Celso Daniel” – prefeito de Santo André assassinado no início de 2002, em circunstâncias até hoje obscuras. A outra metade, para pagar dívidas de campanha em Campinas. Ronan foi condenado no ano passado por participar de um esquema de corrupção na área de transportes da prefeitura de Santo André durante a gestão Celso Daniel.

É verdade que, em seu depoimento, Bumlai isentou Lula de envolvimento nas tratativas para a quitação do tal empréstimo. Como de praxe, o Instituto Lula emitiu uma nota negando as acusações, embalada em termos como “supostas” e “vazamentos seletivos”. Eis o teor da nota: “Não comentamos vazamentos ilegais, seletivos e parciais de supostas alegações que alimentam a um mercado de delações sem provas em troca de benefícios penais”.

Também é verdade que Cerveró mencionou em seu depoimento propinas de US$ 100 milhões destinadas à compra do grupo de energia argentino Pérez Copanc (PeCom), em 2002, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, por US$ 1,03 bilhão. Cerveró ainda citou textualmente propinas negociadas com o presidente do Senado Renan Calheiros e com o senador Fernando Collor de Mello, segundo ele o responsável por todas as indicações nas diretorias da BR Distribuidora.

A menção ao caso no governo Fernando Henrique certamente servirá de alento para os petistas tentarem desviar o foco da denúncia, sob a alegação – correta, por sinal – de que o governo Lula não criou a corrupção na Petrobras. Mas há uma diferença substancial entre as duas histórias. A menção à PeCom é uma acusação genérica, sem nomes ou detalhes a respeito da cadeia de comando dos envolvidos, em que a sigla FHC aparece quase como um índice de localização no tempo de um episódio que ainda precisa ser investigado melhor. A citação a Lula traz detalhes de um empréstimo que existiu, cuja finalidade fraudulenta foi admitida pelos donos do próprio banco que o concedeu.

Reconhecer a credibilidade de Cerveró para denunciar a corrupção no governo FHC (sobre a qual ainda faltam maiores evidências) não equivale a reconhecer sua credibilidade para denunciar a corrupção no governo Lula (sobre a qual as evidências são abundantes)? Eis o dilema que se apresenta para aqueles que costumam esconder sua falta de argumentos sob o pretexto de que houve “vazamentos seletivos”. Ao implicar Lula, o governo FHC, Collor e Renan, Cerveró pode ter cometido equívocos – mas não pode ser chamado de “seletivo”.

Bumlai foi atendido ontem num hospital de Curitiba por problemas de saúde que persistem na prisão. Delcídio Amaral, o senador petista que tramava melar a delação de Cerveró, continua preso e foi rifado pelo PT. As investigações prosseguem, agora com denúncias contra o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, derivadas de mensagens trocadas com o empreiteiro Léo Pinheiro. O Lava Jato continua a girar seus rotores felpudos e ensaboados, a despejar a espuma clara de seu detergente sobre a elite de Brasília – e Lula, em que pesem todas as negativas e todos os “supostos”, continua na fila.

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